O
candidato à saúde mental, à paz e à realização espiritual não
pode descuidar-se de uma higiene estética. Ele deve selecionar a
qualidade e controlar a quantidade das impressões externas e
internas, a fim de que seus sentidos, ávidos eles mesmos de cada vez
mais satisfações, não o desviem da meta.
Aqui,
como em todos os campos e aspectos da vida, o homem só terá saúde
se souber manter-se senhor e jamais deixar-se dominar. Ser senhor
quer dizer ter controle. Ter controle sobre uma ação significa
poder, conscientemente,
começar,
acelerar, retardar, parar, recomeçar quando quiser, portanto,
dirigir a ação. Desde que perca o controle de seus sentidos,
tornando-se um sensual, o homem
pode descer aos abismos da infelicidade e da degradação.
No
controle da sensibilidade, o candidato à felicidade deve: a) saber e
poder escolher as impressões que contribuam para isto, e usá-las na
medida certa; b) reconhecer e poder obstar as impressões adversas e
delas defender-se; c) saber distinguir entre as benéficas e as que
são somente agradáveis; e
d)
saber discernir as que podem vir a se tornar obsessivas, a fim de
evitá-las.
Como se
já não bastassem os dramas, sofrimentos, apreensões, decepções e
mesmo tragédias que o destino semeia em cada vida, e que acarretam
enorme desgaste nervoso e, portanto, distúrbios, a indústria das
emoções, através do cinema, da telenovela, do teatro, bem como os
espetáculos desportivos violentos, como as lutas, as corridas, os
campeonatos, diariamente submetem o
público a perniciosos impactos.
Tanto
mais bem elaborados sejam os espetáculos, tanto mais eficientes, e
tanto mais capazes de contribuir para desordens nervosas. E o
público, fascinado, inconscientemente, se entrega aos forjadores de
emoções. Estas devem ser cada vez mais excitantes, profundas e
dominantes. Na Roma antiga eram os gladiadores que atendiam às
necessidades malsãs do sensualismo do público sádico. Hoje são os
lutadores de MMA etc. que se esmeram, por todos os modos para
infundir violência e ódio em milhões de inadvertidos, imaturos e
viciados espectadores.
Quanto
mais "proibido pela censura", mais preferida é a película
de cinema. A fórmula violência, terror e sexo é a mais comercial e
portanto a preferida por produtores, diretores e exibidores de
filmes. As frases com que tais filmes são anunciados bem demonstram
um clamoroso quadro de saúde mental do grande público. Apregoam o
que o povo deseja: violência e erotismo.
Desgraçadamente
isto é o "normal", o mais freqüente. O "normal"
é isto, esta busca irracional e patética de cada vez maior prazer,
sensações mais perturbadoras e divertimentos com alto poder
estressor. Por que as pessoas pagam para se meterem numa montanha
russa? Por que multidões se alinham nas
margens de uma pista de corrida de carros, esperando que um deles se
despedace? Por que o teatro está cada vez mais explorando o mórbido
e o erótico? Por que as músicas da juventude vão se tornando mais
barulhentas, mais à base de ritmo e mais carentes de melodia e
harmonia? Por que a poesia deu lugar à novela sexo-policial? Por que
o carnaval, cada ano, é mais bacanalizado? Por que até crianças
uivam de entusiasmo com o estrangulamento que um lutador está
fazendo no outro? Por que os jovens roubam carros e com eles
suicidamente "voam"? Por que, cada dia, novos divertimentos
são inventados tanto que desencadeiem sensações novas, que
"enlouquecem" seus participantes? Por que o jovem, em todo
o mundo, está empenhado
na corrida psicodélica?!. . .
Você
que quer ter paz; você que não deseja e nem precisa sentir-se
ajustado e mesmificado com esta alarmante "normalidade",
tome consciência do fato, analise-o, com distância, e se defenda
contra a corrupção sensual coletiva, contra a esquizofrenização
da sensibilidade. Você não precisa destas sensações. Deixe-as
para os que não têm como desfrutar das suaves e sadias sensações
espiritualizadas, patrimônio de quem empreende a vida redentora do
Yoga.
Se, por
acaso, você já é um sensual, pode começar a desconfiar de que seu
distúrbio nervoso tem raízes nesta distorção estética, isto é,
neste estado patológico de sua sensibilidade. Se você tem dado
rédeas à sua sensualidade, ou melhor, a seus jnanaindriyas
(os
sentidos), comece já a formular um plano para
corrigir-se disto, que o escraviza ao mundo e o afasta de Deus.
Resista à alucinofilia crescente que está arrebatando os fracos de
todo o mundo.
Você
não ignora que a ansiedade, a tensão e as emoções se expressam no
fígado, nas glândulas supra-renais, na hipófise, na área
cardíaca, final e praticamente, em todo o organismo. Você sabe o
quanto a ira e o temor danificam a saúde. Não é verdade? Ora, sem
você querer, e por serem impostos pela própria vida e forçados
pelos pressões sociais, os motivos de apreensão têm assaltado você
e, desejando livrar-se de tais situações, você tem dado muito de
seu esforço e também perdido saúde.
Não vai
me dizer que lhe agrada a ansiedade, enquanto espera a resposta de um
negócio que propôs ou o resultado de um exame clínico ou mesmo das
provas do concurso. Ninguém se sente bem quando está sentindo medo,
ou ira, ou vergonha, ou remorso. A ninguém agrada viver debaixo de
drama, ameaça e vicissitude. Ao contrário, todos almejam
tranqüilidade, vida suave e espaço social bem desimpedido para
expandir. Todo mundo sonha com momentos emocionalmente neutros.
Pois
bem, você que não gosta das emoções que o destino espalha em seus
dias; você que estimaria desfrutar horas de tranqüilidade e
quietude, por que vai meter-se num cinema para assistir a um filme do
estilo suspense?! Pode ser um grande tédio o motivo de buscar
excitação em divertimentos ou como torcedor apaixonado de qualquer
esporte. É possível que você esteja praticando esta forma de fuga.
Há quanto tempo?
Divertindo-se,
você tem conseguido livrar-se do tédio? Seja sincero. Seja
inteligente ao responder. Se você já se livrou do tédio, do
sentimento de vazio graças a tantos entretenimentos excitantes, seu
exemplo vai ajudar a resolver o problema de milhões de pessoas. Seu
caso será de alto interesse para a psiquiatria, para a medicina
psicossomática, para os educadores, para os líderes religiosos,
para todos que procuram o caminho certo para salvar do tédio o ser
humano.
Se no
entanto você ainda está precisando "divertir-se" e cada
vez mais, se você ainda não pode passar sem contorcer-se de emoção
nas arquibancadas enquanto seu time está jogando, saiba que o
"remédio" falhou. Escapismo nunca salvou ninguém. Na
verdade, cada vez que o espetáculo termina os sentidos que estiveram
sendo gratificados começam a pedir mais alimento, mais excitação.
Há um
vício de excitar-se, de ocupar os sentidos, de emocionar-se, de
características semelhantes ao tabagismo, alcoolismo, psicodelismo e
outros. Todos estes vícios se caracterizam por uma vinculação
obsessiva a seu objeto particular, seja à tragadinha, ao traguinho,
aos comprimidos, "às picadas", ao vídeo,
à tela de cinema, ao alto-falante do rádio. Outra característica
de tais vícios é a de que nunca se consegue quietude a não ser
enquanto se está atendendo às imposições do tirânico objeto
obsidente.
Relativamente
à sensibilidade, desde o berço começamos a ser viciados, quando,
com chocalhos, bonequinhos de apito, enfeites coloridos, somos
ensinados a distrair-nos. É com ajuda deste ou daquele tipo de
espetáculo doméstico, provido pelo pai, ou pela mãe ou titia, que
o bebê concede receber a alimentação.
Pela
vida a fora — infância, adolescência e vida adulta — os
entretenimentos "indispensáveis" vão frustrando um
acontecimento que "normalmente" todos evitam: um encontro a
sós consigo mesmo, em silêncio.
"Suponhamos,
diz Fromm (Psicanálise da Sociedade Contemporânea), que, em nossa
cultura ocidental, os cinemas, as emissoras de rádio, as televisoras
e os acontecimentos esportivos deixem de existir por apenas quatro
semanas. Fechados esses principais canais de fuga, quais seriam as
conseqüências para as
criaturas, reduzidas repentinamente aos seus próprios recursos? Não
tenho dúvida alguma quanto a que mesmo nesse curto período de tempo
ocorressem milhares de perturbações nervosas, e muitos milhares de
criaturas fossem lançadas em um estado de ansiedade aguda que não
difeririam do quadro diagnosticado clinicamente como neurose."
Vejo
nesta educação para o esvaziamento, para a saída de si mesmo, para
a alienação de si mesmo um dos fatores causativos do quadro que o
mesmo Fromm assim descreve: "Hoje em dia encontramo-nos com
criaturas que agem e sentem como autômatos; que jamais experimentam
algo realmente seu; que sentem o
seu eu inteiramente como pensam que supostamente seja; cujo sorriso
artificial substituiu o sorriso espontâneo; cuja tagarelice vazia
substituiu a palestra comunicativa; cujo surdo desespero substituiu a
dor autêntica."
Se não
fosse por outros motivos, bastaria saber que os divertimentos e
esportes, por outro lado, salvam tantos da neurose, para que eu não
alimentasse a idéia de combatê-los. "Tudo é necessário",
ensina Suddha
Dharma. É
necessário que continuem existindo "esses canais de fuga",
e que poderiam também ser veículos sadios de cultura e instrumentos
de educação.
Cinemas,
esportes, literatura, teatro, televisão e rádio não constituem
fatores de desordens nervosas a não ser pela forma irracional,
inconseqüente e amoral em que hoje em dia são "explorados".
Na mesma tela em que, na semana passada, milhares de adolescentes
"aprenderam" com os olhos, com o cérebro, com o organismo
inteiro, como assassinar ou estuprar uma jovem, nesta semana as
crianças recebem uma daquelas maravilhosas mensagens de Walt Disney
e saem do cinema felizes e enriquecidas, depois de terem degustado,
pelos sentidos, momentos de poesia.
O mesmo
aparelho televisor que exibe as brutalidades do MMA ou as banalidades
do humorismo calhorda apresenta outros espetáculos ética e
esteticamente admiráveis. Num cardápio você escolhe os pratos que
lhe convém e não liga para os outros. Faça o mesmo quanto a
programas de divertimento. Eduque-se esteticamente. Desenvolva, não
somente bom gosto, mas o discernimento. Não escolha somente o
agradável, mas o que lhe proporcione mais equilíbrio, paz e
segurança psíquica e saúde orgânica.
Você já
sabe das alterações profundas que se processam no organismo em
conseqüência das emoções. Você conhece como o simpático e as
glândulas endócrinas sob os impactos ou stress
emocionais
provocam rebuliço nos órgãos e em suas funções.
Não
ignora também que emoções suaves, delicadas, belas repercutem
convenientemente em nossa felicidade na mesma medida em que as
emoções violentas, alarmantes, negativas minam a saúde e
equilíbrio.
Use os
filmes, a música, os programas de entrevista, o bom teatro, a
literatura inteligente, com fins educativos e terapêuticos. Os
mesmos veículos que tanto mal têm
feito têm o enorme poder de construir, de enriquecer a personalidade
e melhorar a saúde.

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